19 novembro 2019

Naquela noite ele perguntou-lhe pelo deus dela. Ela não sabia como responder. Falou em destino, em coisas que lhe tinham acontecido, mas tudo muito vago, sem conteúdo nem estrutura. O Deus. Como poderia ela explicar a relação que tinha com ele, os ganhos, as perdas, as aceitações e as desilusões? Enquanto conversavam, pensava nesse Deus e da forma como se tinha apoiado nele para viver momentos difíceis. Na forma como o tinha dado às pessoas que precisavam dele...e na maneira como ela o discernia nessa equação tão paradoxal que era viver.
Lembrou-se da história de Paraty. Naquela cidade, onde tinha chegado sozinha depois de Ilha Grande e de grandes encontros. Chegou aonde ninguém a esperava. Chegou a um lugar que lhe parecia tanto com Portugal, que uma saudade incrível de algo que não sabia o que era, lhe assolou o coração... Percorreu as ruas da calçada, encontrou umas pessoas de um couchsurfing que lhe tinham proposto alojamento... e foi de boleia até uma casa no meio da mata atlântica, uma casa rudimentar, onde se ouvia a cachoeira de uma forma quase ensurdecedora... mas não é esta história que quero agora contar. Essa está no diário da viagem. Quero contar a história do dia em que deixei Paraty e estava imensamente triste. Daquelas tristezas que me apanham desprevenida, triste e melancólica. Sem saber porquê. Estava com a minha mochila, e andava pela cidade a fazer tempo até apanhar o autocarro para mudar mais uma vez de lugar e rumar sempre até norte.
Deambulava pela cidade sem rumo, a ver rostos e paisagens quando junto de mim aparece...

Enquanto escrevo estas linhas, decido que afinal não vou escrever. Não consigo porque escrever parece-me simplificar uma emoção, dissecá-la e transpô-la para o papel. Não quero. Prefiro contá-la, sentir os arrepios na espinha enquanto a conto, ter as lágrimas que me vêm aos olhos e aquele aperto na garganta de narrar algo simples mas, para mim, incompreensível e poético.
A poesia dos momentos é para ser vivida. Desculpa.

11 março 2014

Para escrever


Para escrever preciso sempre um ambiente ideal. De um dia ideal, da musica ideal.
Raramente o texto é construído, alinhado, arquitectado como deveria ser. O que faz de um escritor, um escritor? O que é que nos faz ter vontade de alinhar em linhas e versos textos e vozes que nos vêm à boca e aos olhos?

Aqui, no silêncio, em que me escuto e escuto os barulhos que me rodeiam, sei que não estou sozinha. Sei que esta casa, quase centenária esconde segredos no soalho e nas paredes. Durante a noite sei-me acompanhada e durante o dia há vozes e sopros e movimentos. A co-habitação é pacífica. Aceito-os e eles aceitam-me, eu creio. Nunca me senti mal-vinda. Acompanhada sim, mas nunca mal-vinda. Não sou intrusiva, aceito e questiono pouco. Quase nada  há a questionar. Confio na minha sensibilidade e isso chega-me.

Pesa-me a preguiça da pena. O caderno que utilizo repele-me, ele mesmo. Apelidei-o de "Caderno de quem fica". Escrevo-o em momentos de desespero. Nos de lucidez, faço coisas sérias e práticas e convenço-me de que sou produtiva.

Vivo um momento de limbo. De contemplação e questionamento. A vontade de partir é constante, embora por vezes acalmada em doces manhãs de domingo. No entanto, são acalmias fugazes. O espírito esse está sempre em turbilhão, questionamento, agitação. Como se dançasse, a vários tempos, a várias vozes, a vários ritmos.

Quero escrever um romance.

Círculos.


29 outubro 2013


Porto, 29 de Outubro de 2013

Cheiros. Vêm-me os cheiros à boca e ao coração. Cheiro de castanha, de livro velho, de bolos... cheiros familiares, que me trazem à vida. Que me reconciliam com a vida. Que me fazem sentir ter 13, 14, 15 anos e percorrer as ruas do Porto, a viver. Que bom que é regressar e sentir-te assim. Ver-te assim como se fosse a primeira vez em meses ou anos. Que bom sentir que te pertenço e a ti regresso quando preciso. Entidade magna e altiva, invicta muy nobre e sempre leal cidade do Porto.

17 setembro 2013



"O amor é coisa de gente, é um soluço
presente, é algo que nunca vem; quando
se acha, a si mesmo se perde; quando se
vê, já não mais se tem; é o tudo que é nada
que é tudo.
Não adianta chorar as pitangas, sabemos
onde as lágrimas não vão dar.

Não há espelho ou máquina que
o amor retrate, 
quem vai querer comprar tomate?"



16 setembro 2013

Une petite análise autour des sentiments


Un ressentir bizarre.. Quelque chose que depuis samedi aprés-midi je sais pas oú mettre. J'aimerais comprendre ce putain d'angoisse autour de moi. Des mots dans ma tête qui me disent "non, il faut pas aller par lá... non, tu étais dejá lá, et il t'a fait malheureuse".

Oui, je sais. Vous avez tous raison.

"Mesdames et Monsieurs,

Je voudrais vous parler des hommes qui j'aime....  Fin."

10 setembro 2013





Insatisfação.






Ânsia.









Ontem

Extratos do Diário de Viagem ao Brasil.
Como se fosse ontem.

"Recife,
31 de Julho de 2013
a meio da tarde

Por momentos perdi-me de mim. Por momentos saí, esbaforida, tonta, tentando encontrar um apoio, um vício, algo que me anestesiasse. Não sei porque estou aqui. Não sei porque é que de repente voltou a ter tanta importância para mim. Não, não quero. "Estou lúcido como se estivesse para morrer". Por vezes duvido de mim e não quero. Quero estar segura e certa. Firme e confiante como fui até aqui. Até hoje. Esta confiança é tirada a ferros, é forjada, é falsa. Eu não sou o que sou nem creio no que sou. Eu que sou o que não sou. Viver como? Para quem? Para mim. É o que quero aprender a ser e a fazer. 
Agora, hoje, aqui em Recife, à frente deste rio com esta brisa morna nos cabelos o que me dói é o passado. O passado inútil como um trapo. O passado amarrotado e atirado no caixote do lixo a troco de nada. Nestes últimos tempos, tenho-me confiado à vida, tenho aceitado o que a vida me dá e me tira porque até aqui tudo tem feito sentido e tudo se tem conjugado da melhor forma. Penso que hoje vi o que deveria ter visto, li o que deveria ter lido para poder cortar as pontas e dar o nó necessário. Tenho que aprender a dar nós e a afogar solidões. Tenho que viver para mim. Ainda me estou a descobrir, ainda estou a tentar ver quem eu sou e para onde vou... Achei que estava no caminho certo. Perdoar?
Aqui tudo é mais forte. Aqui tudo é poesia. Aqui todos trazem poesia dentro de si. Fico até domingo. Depois preciso libertar-me. Quero voar sozinha. Preciso de estar sozinha. Ontem, a vaguear pelo velho Recife senti que pertencia aqui. Muitas vezes no Brasil tenho sentido que pertenço aqui. Para o ano venho para cá. Preciso de sair daquela Europa cinzenta e aniquilante. Quero ver e viver a Bolívia e o Chile. Mais do que de lá, eu sou de cá. Uma vez mais escrevendo sobre isto sinto que há pontas que se atam, pontas soltas, perdidas que se encontram. É como se tudo fizesse sentido e eu tivesse achado um lugar para ficar. Não posso continuar a tentar encontrar pontos de abrigo nos outros. Eu sou o meu ponto de abrigo. Eu sou o meu mar morto e o meu mar alto. Eu.
Continuo grata à vida por estar aqui. Continuo a sentir-me abençoada. Preciso apenas de estar sozinha, nada mais. Estar apenas comigo. "Só me encontro quando de mim fujo". É nesta fuga constante, diária talvez, que me tento encontrar, que me tento sentir. Sentir-me. Como a mulher que beijava os seus lábios encontrando em si mesma lugar/prazer infinito"

"Olinda, 3 de Agosto de 2013
10h30

Dor de cabeça. Se me dói é porque está aqui, não é? E porque é que eu a sinto tão longe? Habita em mim uma angústia estranha, bizarra, como se por dentro, neste momento, toda eu fosse migalhas de um pão seco, bolorento deixado a um canto. Subitamente silêncio, durante alguns segundos um silêncio profundo e apenas o som do vento nas árvores. Há um espanta-espíritos que toca em si uma linda melodia chinesa, na chaise longue um gato que dorme majestoso como se fosse o dono do mundo, num canto um incenso que liberta cheiros milenares. Do lado de fora um barulho estridente de pássaro, o gato que acorda e a melodia chinesa que pára. Queria levar tudo isto comigo. Queria poder reproduzir tudo isto e poder viver isto comigo e para mim. Preciso de uma casa, de um lar, de um poiso. Até quando este nomadismo e errância sem fim? Até quando o desprendimento às coisas e aos seres? De noite os mosquitos comem-nos vivos e ainda por aqui andamos. Não sei como."

"Viagem de João Pessoa para Natal,
8 de Agosto
A hora do Trem Passar - Raúl Seixas 

Às vezes a alegria é tanta que acho que o peito não vai aguentar... Compreendo tantas coisas agora: a viagem, o desapego, a descoberta, a estrada... tudo é perfeito e se conjuga e completa entre si! 
"Jogar meu corpo no mundo"
"esse meu coração que é tão vagabundo"


09 setembro 2013

Com os limões que a vida lhe ia dando Já não sabia como fazer limonada Usava-os para beber shots de tequila. O açúcar foi sendo progressivamente substituído por sal. Salgou-lhe a vida e o paladar.

31 agosto 2013

Preparar a chegada


Viagem

Preparei-te na pedra da casa
asas do pássaro Kalulu
com pedaços de árvores destroçadas pelos raios
e resina quente.
Chamei a metade gémea do espírito
para te passar remédios 
da cabeça até aos pés.

Nu fundo de meu corpo perfeito
escondi
pedaços de argila e feitiços fortes.

Em cada uma das doze cabaças da origem
deitei o vinho dos votos
um pano novo da costa
três missangas azuis
e cera da colmeia menor.

Todos os dias conservei aceso o fogo sagrado
Na hora dos fantasmas
o vento diz-me a tua voz
é a voz das viagens
sem regresso.

Ana Paula Tavares in "Dizes-me coisas amargas como os frutos"

Porque os outros dizem-no melhor do que eu. E a garganta apertada nunca ajudou ninguém a escrever como deve ser. 


19 agosto 2013



A magia perde-se. As pessoas perdem-se. Os amores perdem-se. Gastam-se. Enforcam-se. Matam-se. Sufocam-se. 
E depois vem outro, e mais outro e mais outro e mais outro. E a felicidade pode estar mesmo ao virar da esquina.


É preciso saber voltar.
Naquele dia tudo fazia sentido: a música, o céu cinzento, a calma aparente de espírito, a mudança que se avizinhava. A aceitação e resignação. Ainda assim era a música que lhe lembrava de onde vinha... o que fazia ali... só não sabia para onde ia.
A rosa apaixonou-se pelo cacto.
Compreendia seus espinhos.

Os sonhos não envelhecem.
20's de Maio de 2013

O coração bateu tanto, acelerou tanto, correu tanto... que explodiu.

Ela, morreu ali.
Língua de fora, olhos revirados, ar de parva. 

O outro, riu-se. Mas não foi com uma gargalhada sonora e cantante, mas com um riso condescendente, de desprezo e ironia.
Até ele ter entrado ela tinha-o amado serenamente, secretamente, estupidamente. Ali, sem como nem porquê, sem pré-aviso, ele entra de rompante de braço dado com a loira estonteante e ela, a nossa heroína, não aguentando o impacto, explode-se-lhe o coração. 

Coitada. 
De tanto amar, estupidificou. Petrificou. Infantilizou. E a vida não perdoou. 
Morreu parva, de uma maneira espontânea, arrebatada pela paixão. Afinal, acabou por morrer da maneira como sempre viveu. Apaixonadamente. Livremente. Espontaneamente.

P.S - A culpa é sempre das loiras.
Nem sequer é uma história. É algo insosso e desenxabido que um tótó escreveu numa mesa de café, crendo-se escritor. Intelectual de merda merdica. A caneta vermelha é propositada. É a mandar os outros à merda, devagarinho, com muita subtileza, num vermelho quase rosa, quase claro, quase inofensivo. 

Non sense short-stories

Clermont-Ferrand, 20 e tal de Maio 2013

Viveu toda a vida pensando que era céu. Um dia acordou e era terra e viu que fedia a podre, a batatas e a compostagem! Nunca pensou deixar descendência até que todas aquelas cenouras brotaram de si e largaram um liquido viscoso, untoso e gorduroso. Era pai. Ou mãe? Qual era o seu género? O seu sexo onde estava? Assim de repente viu-se rodeado de pontos de interrogação flutuantes enquanto os olhos se trocavam entre si em movimentos absurdos. Arrotou e morreu. Viveu confuso, o coitado(a?).


          

29 maio 2013

Viagens na minha terra - Capítulo II

S.Tomé de Negrelos,
30 de abril de 2013, 9.33 a.m.

"Gente da minha terra"

Por estar longe, tantas vezes esqueço-me do que é o verdadeiro Portugal, esqueço-me desta gente, deste interior a pouco mais de 40 km de uma grande cidade, deste ar fresco, dos sinos a rebate a cada 15 minutos e desta genuinidade. Esqueço-me desta gente autêntica e genuína que saúda um estranho como se fosse um vizinho: um bom dia grave e firme, com alguma parcimónia e distinção, mas natural e espontâneo como um gesto de todos os dias. 
Primeiro estranhamos e rimo-nos para nós mesmos: "estas senhoras que não conheço de lado nenhum disseram-me bom dia, que giro!". Depois vemos que todos o fazem e após uns 20 minutos de poiso numa esplanada num café central, o Bom dia torna-se viciante e somos nós, forasteiros em terra alheia que, ávidos desta irmandade coma gente da terra, procuramos sôfregos os olhares e os rostos em busca desse Bom dia com distinção e parcimónia.
Entretanto, na rua calma e povoada de chilreios, passa uma carrinha que perturba a calma aparente do lugar com os cantares ao desafio minhotos que passam nas colunas já antigas e gastas. Na parte de trás da carrinha de caixa aberta: "Zé Batateiro". No interior dois homens muito sérios e compenetrados na estrada e ignorando os cantares aos desafio que berram nas colunas, quem os visse poderia dizer que estariam ouvindo as notícias da rádio Afifense ou  até mesmo o Requiem de Mozart, tal era a postura solene e sóbria.
Neste café, decidi ficar cá fora, na esplanada. Possivelmente estão uns frescos 10 graus. Não há sol e o tempo está enublado. Contudo, eu, pessoa friorenta, optei por ficar do lado de fora. Como se há muito tempo me sentisse "despaísada" e tentasse encontrar alguma ligação à terra; como se há muito tempo não sentisse este sentimento de pertença a algo que não me pertence.
Quando é que pertencemos à terra? Quando é que a terra deixa de nos pertencer? Quando é que deixamos de ser meros viajantes na terra alheia para nos apropriarmos dessa terra? Talvez seja por isso que viajamos. Para pôr à prova a nossa lealdade às raízes, para nos questionarmos diariamente se estamos onde deveríamos estar, se a nossa presença num determinado local influencia de alguma forma o local ou se somos nós que nos deixamos influenciar. Ganhamos o quê ao viajar? Entre o que ganhamos e o que perdemos porque é que optamos sempre por partir? E se aquilo que ganhamos ao partir pudéssemos ganhar ficando? Há quem diga que partir é fácil, difícil é ficar. Eu digo que partir é difícil mas é bom, recompensador, sabe a vitória superada. Ficar é também difícil e sabe a fracasso, a comodismo, como se nos tivesse sido dada a possibilidade de fazermos o que quiséssemos da nossa vida e a estivéssemos a desperdiçar, a vida. 
É por isso que para já, enquanto busco respostas, enquanto tenho força e energia vou optando por partir. Um dia talvez opte por ficar, não sei. 


O que é desistir de alguém?


Abandonar?
Deixar para trás?
Seguirmos o caminho sozinhos?

Eu já desisti de alguém. Desistir tem sabor a fraqueza e a maldade.
Depois, temos que nos perdoar a nós mesmos. E isso custa. Muito. E dói. 

22 abril 2013

Viagens na minha terra - Capítulo I

Porto, 22 de Abril de 2013
8h18 a.m.



À mesa deste café barulhento e feio sinto-me em casa. Todos os sons são-me familiares e próximos: a máquina do café que tira meias-de-leite e que faz um barulho absurdo; estas senhoras de meia-idade que se sentaram ao meu lado e que algures ao longo da vida delas esqueceram-se do que é falar baixo e só conseguem comunicar aos berros; o barulho das chávenas nos pires e dos pires no mármore do balcão e das colheres nos pires. Enquanto isso, eu, tento ler desesperadamente uns textos em francês. Não consigo. Sinto uma urgente vontade de descrever todo este cenário à minha volta, de registar isto de alguma forma, para provar que existiu, e que eu vivi e que estive aqui.


Joana

11 abril 2013

História de amor

O braço fundiu-se com a perna.
A perna sorriu. Não estava à espera daquela fusão. Se fosse do pé, ou joelho ou da coxa... ainda vá, agora do braço? Ele sempre lá no alto, tão solicitado e solícito, porquê o súbito interesse na perna? Ela tão mal tratada, com pêlos e varizes, e o braço bem tratado, musculado e cheiroso...
Sem se questionara perna deixou-se ir. Deixou-se amar loucamente e fundiu-se com o braço. No final, já sôfrega e cansada esqueceu-se que a outra perna estava mesmo ali ao lado e que tinha presenciado tudo. A tudo tinha assistido, mesmo sem querer. Mas não tinha mãos para tapar os olhos, então susteve a respiração muito muito muito tempo, as veias incharam, de azuis passaram a roxas, laranjas e pretas até que explodiu. 
A outra perna viu-se a ela mesma com um arco-íris de tinta acrílica derramado sobre si, com cheiro a podridão, o qual teve que suportar enquanto ali permaneceu.
Da promiscuidade

Pesa profunda a profícua poeira
pesa prolongadamente
puxando a perna com a pena
penando pesadamente profundamente
penetrando, proliferando...
pomada primitiva predominando o ar
          e um forte cheiro a maçãs
                 e um suave toque na ida.


29.03.2013
 

Das memórias

Admiro a capacidade que as músicas têm de nos transportar no tempo a uma velocidade impressionante. 
Sem estarmos à espera há emoções, cheiros, bateres de coração mais acelerados que nos levam a tempos perdidos, escondidos, que deixamos caídos a um canto do coração.
Porque é que estamos condenados à saudade e à nostalgia? Trocaria uns meses desta vida por um só dia há uns anos atrás. Um dia. Normalíssimo. Um sábado, talvez.
Os sábados sempre tiveram algo de relaxado, delicioso, divertido, aventureiro. Onde guardamos as memórias? Porque é que elas teimam em sair-nos pelos poros nos momentos mais inconvenientes? 

Descrição de uma cena: Sábado de manhã; mês de Junho; calor; cheiro absurdo a maresia.
Na rádio: Goodbye Stranger - Supertramp

Eu: O que é que estás a fazer?
Ele: Ainda não me esqueci.
Eu: Posso ajudar?
Ele: Agora não. Vou só acabar isto e já saímos.
Eu: Vamos onde?
Ele: Onde quiseres. Mas primeiro tens que me deixar acabar isto.
Eu: Mas isto é para quê?
Ele: Já te disse que ainda não me esqueci.
Eu: O que é que eu faço?
Ele: Esperas que eu acabe.
Eu: Mas assim... sem fazer nada?
(levanto-me e caminho em torno dele, incliono-me, debruço-me, tento compreender o que está a fazer, espreito, meto o dedo no que ele está a fazer, dou meia volta, corro um bocadinho, volto ao mesmo local)
Eu: E agora? Já está? Já podemos ir fazer uma aventura?
Ele: ....
Eu: Já está?
Ele: Sim, onde queres ir?
Eu: Quero ir viver uma aventura.


27.03.2013

18 fevereiro 2013

Ensaio sobre a lucidez

"Pensar é estar doente dos olhos"

Pensar é não viver

Pensar é intelectualizar, racionalizar, equacionar sentimentos

Pensar é perder a espontaneidade

Pensar é viver dentro da nossa cabeça em vez de saltar, dançar e cheirar as flores

Pensar é matar a criança barulhenta que vive sobrevive em nós

Pensar é estar doente dos olhos e da cabeça

Pensar é abandonarmo-nos ao mundo

Pensar é estar só e viver na solidão como quem escolhe mudar de cor de cabelo

Pensar é morrer um pouquinho todos os dias.


Xuanita

03 fevereiro 2013

Da Arte

Quand l'amour n'est pas assez, on apprend a se nourrir autrement... comme dans l'art! Et on découvre tout un nouveau monde :)

"A arte existe porque a vida não basta" Ferreira Gullar

13 janeiro 2013

Medo



"Quem dorme à noite comigo
É meu segredo,
Mas se insistirem, lhes digo,
O medo mora comigo,
Mas só o medo, mas só o medo.

E cedo porque me embala
Num vai-vem de solidão,
É com silêncio que fala,
Com voz de móvel que estala
E nos perturba a razão.

Gritar quem pode salvar-me
Do que está dentro de mim
Gostava até de matar-me,
Mas eu sei que ele há-de esperar-me
Ao pé da ponte do fim."

11 janeiro 2013

Na mesa do café

A velhinha francesa, da profundeza dos seus olhos verdes, possuía uma calma inabalável, uma altivez e confiança no olhar, como se já tivesse vivido tudo o que havia para ser vivido e agora apenas contemplasse. Tinha um porte magnífico e simples, cabeça erguida e um olhar presente, confiante como quem ainda vive, disfruta, não teme e observa. Sim, penso que ela observava tudo o que se passava naquele velho, charmoso e degradado café ao estilo dos anos 50. Pleno de gente, maioritariamente homens, era a única senhora da sua idade que ali estava. E no entanto, isso não a perturbava... estava ali como se aquele fosse o único sítio onde ela quereria estar naquele domingo de manhã. Estava sentada e observava tudo e todos como se o tempo e aquela mesa de café lhe pertencessem.
Perdida na contemplação e análise dos outros lembrou-se do amor que perdeu. De todos os amores que perdeu à força de pouco os amar; lembrou-se que do alto da sua nobreza, superioridade e quase desprezo pelos outros nunca deixou que de facto alguém se aproximasse dela e que quando ela deu um passo em frente e abriu os braços, já todos os outros os tinham fechado e recuado. Aquela rapariga louca, apaixonadamente louca, decidiu um dia ser séria, viver a vida que todos os outros queriam que ela vivesse e casou-se e teve filhos e divorciou-se. Tudo pela ordem certa e socialmente aceite. Contudo, não amou. Nem os filhos. Teve-os ali ao lado, suportou-os como quem suporta um animal doméstico moribundo. Agora não sabia onde estavam. Tinha-se esquecido do seu cheiro, do seu olhar e tentou lembrar-se desse momento apoteótico da maternidade, mas não conseguiu.
O pior de tudo, ou o melhor de tudo, conforme o ponto de vista, é que não se arrependia e naquela manhã de domingo tudo fazia sentido como sempre fez, e não se colocava questões, nem refletia. Olhava e contemplava todos os outros à sua volta, como fizera até aí e sentia-se plena e segura de si. Tentou lembrar-se do que tinha acontecido consigo e com a sua vida nesses anos em que se limitou a viver pelos outros. Rostos, gritos, vidros, papeis, vieram-lhe à cabeça como um estilhaço. Apercebeu-se que a um determinado momento da sua vida escolheu deliberadamente a solidão para calar os gritos e não mais ver os rostos, rasgar os papeis e partir os vidros.

Tentaria agora chegar a uma conclusão. Tentaria perceber o segredo de tudo isto e ousaria colocar a si mesma a grande questão. Quando o fez, nesse mesmo instante, naquela mesa de café, levantou-se como se tivesse medo de após ter descoberto a verdade a pudesse perder. Saiu o mais rápido que pôde no seu dificil andar de 80 anos. Chegou a casa e os cheiros acalmaram-na. Acendeu vagarosamente as velas que dispunha na escravaninha onde escrevinhava. Colocou a sua ária favorita, aquela onde Dido chora o amante perdido. Sentou-se no sofá, de frente para a janela com o sol a bater-lhe na cara e bebeu preguiçosamente do copo que tinha ao seu lado, como se quisesse adiar e prolongar ao máximo aquele instante.
Alguns minutos depois o telefone toca, ela ainda o ouve lá ao fundo mas já não se consegue levantar, esvaem-se-lhe as forças e o paladar azeda-se. 
Ao telefone, um dos filhos cumpria o aborrecido dever de lhe ligar, esperando que ela não atendesse. 

E assim foi. 

Xuanita

02 janeiro 2013

"Hesitei se havia de escrever esta canção. Porque a vida não se pode resumir a uma canção. Mudar de vida? Mudar de vida é uma questão que ainda não está resolvida."

José Mario Branco

03 dezembro 2012

A senhora da padaria

A senhora da padaria é a senhora francesa mais colorida que conheço. Todos os dias usa um gancho com uma flor de plástico do lado direito com brincos, óculos e maquilhagem a condizer. Não consigo evitar de sorrir quando a vejo. Ela é de facto uma lufada de cor fresca nesta terra em que as pessoas se vestem em tons de cinza, a condizer com os edificios e com o asfalto. Penso que elas têm medo de destoar e por alguns instantes sentirem que não pertencem aqui. A senhora da padaria não tem medo da cor, nem de falar alto, nem de sorrir, nem de parecer um tanto ou quanto ridícula. Ela é feliz, eu creio. 
Não deve ser francesa.

28 novembro 2012

As mulheres americanas

As mulheres americanas estão todas as quartas-feiras de manhã no café a tomar chá.
As mulheres americanas falam alto para que as outras pessoas ouçam que elas são diferentes.
As mulheres americanas são todas parecidas: cara de enjoadas, cabelos compridos e roupa de dona de casa desportivó-confortável.
Estas mulheres americanas distinguem-se das outras: das que vêm com as crianças. 
Estas fingem interessar-se pelo mundo, pelos problemas da sociedade e por vezes parece até que falam de trabalho.
As outras vêm com a filharada toda atrás e falam de bolos, de fraldas, de maridos impotentes, de seios doridos de amamentar, de barbecues, de toalhas de casa de banho e dos lençóis que a empregada portuguesa não mudou. São mais genuínas. 
Vê-se na cara delas a angústia da perda da identidade para um marido que não amam, para uns filhos que as atormentam e tudo isto num país que não suportam. Tudo por uma confortável conta bancária, uns implantes de silicone para mostrar aos maridos das outras e a felicidade de não pensar (muito).

Quando sós, estes espécimes tendem a extinguir-se. É como se perdessem o resto de luz e de vida que ainda tinham. Esvaem-se e esgotam-se. Parecem mulheres francesas perfeitamente normais, com a arrogância e a pitada de snobismo que lhes é característico, e a distância em relação aos outros.
É incrível como de um momento para o outro a mulher americana passa a mulher francesa: apenas precisamos de a retirar do meio da manada e isolá-la num canto. E aí, perder algum tempo a observá-la. Se nos detivermos uns meros 30 segundos conseguimos claramente ver a transformação a operar-se. 

O efeito de grupo é de facto uma coisa fantástica!


Xuanita

05 novembro 2012

Não só a História, mas tambem a vida é cíclica.


"Partir simboliza um desapegar temporário, necessário à sobrevivência. Caso contrário, inviabilizamos a viagem. Regressar significa resgatar o apego silenciado e tornarmo-nos unos novamente com a terra. É por isso que partir é difícil, e regressar também. Porque ambos os paradigmas foram postos à prova e superados, e devem ser postos à prova continuamente sempre que se parte ou regressa." Escrito a 8 de Abril de 2009.

Poderia ter sido escrito hoje. 

Textualmente, palavra a palavra, vírgula a vírgula, espaço a espaço. 

Repetido. 
Vezes sem conta.


Da relatividade do tempo - Parte I


Só quando passamos horas intermináveis à espera de algo, seja uma chegada, uma visita, uma partida, ... é que tomamos consciência completa da absurda relatividade do tempo.

É impressionante como já passaram 12 horas em que estou neste autocarro, sei que ainda faltam 9 horas... e no entanto, encaro-as com tranquilidade e um pouco de satisfação até.

Sim, o tempo é extremamente relativo. E por vezes tem o gosto de uma tarde de domingo: queremos que passe o mais lentamente possível para que possamos saborear cada preguiçoso minuto.

Em viagem o sabor é diferente. É sabor a paisagem, a música, a reflexão à janela do autocarro, a deambulação.

Dou por mim a desejar que o tempo páre.

Dou-me conta do absurdo e paro de escrever.


26Out2012

Xuanita

02 outubro 2012

Dança descoordenada, solta e presa. 

Não se consegue libertar das restrições, do peso, dos outros. 
Do olhar dos outros. 

Da censura e do olhar reprovador. 

Ouve-se um riso ao fundo. 

A principio ela não percebe porquê, 
só depois se apercebe que está já no chão, 
que caiu e não viu o fundo, não viu o chão, 
nem sequer sentiu a queda, nem sequer sentiu as pernas. 
Sentiu, apenas, isso sim, o riso de troça dos outros. 
Ao levantar-se parte de si fica para trás, a princípio não se apercebe. 
Só quando está já no fundo da sala, cambaleia e cai novamente. 
Aí roga pragas a si, à prótese e ao inferno. 


Já não consegue sequer voltar… 
fecha a porta com delicadeza, sai e corre. 

Descoordenada, solta e presa ao mesmo tempo. 


...
 Xuanita©

25 outubro 2009


Com uma vontade de mudar, mudar, mudar, mudar, mudar.... e renascer por dentro!

02 outubro 2009

A poesia como recolha dos restos da vida



Dedicado a Eugénio, e tantos outros


Ele chegou e sentou-se. Olhou-o como se fosse ao mesmo tempo a primeira e a última vez. Perdido da dúvida da temporalidade do encontro, lembrou-se que tinham gasto as palavras e as mãos à força de as apertarem. Nas esquinas, em esperas inúteis, ficaram os sonhos, esquecidos e pontapeados de vez em quando. E os olhos, esses eram pretos, como sempre o foram, sem peixes, apenas com brilhos fugazes. No entanto, no momento em que se sentou e o encarou, pareceu-lhe a primeira vez. Pareceu-lhe que subitamente o mundo tinha retomado a sua ordem e todas as coisas assumido a sua forma original. Os sentimentos, esses também tinham rapidamente corrido para os lugares temporariamente vagos, enquanto o pensamento e a razão e a estupidez ocupavam cadeiras lado a lado.

Como vieram esses sentimentos ainda hoje não o sabe explicar. Nunca soube. Acho que nunca percebeu, e preferiu nunca questionar o porquê. A verdade é que estavam ali, à procura dos lugares previamente ocupados. Chegaram como um sopro, um vazio estranho e denso que flutua sem gravidade… Há quem diga que foram os cheiros da casa, há quem diga que foram os olhares trocados, há quem diga ainda que foram as fotografias com as pesadas memórias. Ele diz que foi o brilho e a luz primária, aquela da criação. Eu digo que foi o sorriso. Mas eu não estava lá para ver, esta história apenas me foi contada muitos anos depois.

Rapidamente os olhos desviaram-se, as mãos inquietaram-se, suando e procurando sítios absurdos para se esconderem. As palavras… não saíam. Tinha sido gastas, todas elas. Teriam que comunicar de outra forma. Mas não comunicaram. Murmuram-se sons, interrogações e exclamações inaudíveis. Os olhos giravam em todas as direcções, em sentidos estonteantes e tolos. As mãos produziam água e gordura e medo.

Na confusão do silêncio perderam-se novamente um do outro. Tinham noção que o poema era o que melhor exprimiria ambas as sensações naquele momento. Apertaram as mãos como dois bons amigos que eram, a fim de se despedirem. Contudo, houve um acontecimento que os dois não previam: a água das mãos mesclou-se. Fundiu-se e produziu vinho que inebriadamente beberam do corpo um do outro. Lembrando tempos idos, naquele momento, naqueles breves instantes que durou o aperto de mão, amaram-se como o haviam feito até ali. Até que despertaram como em todos os sonhos, fantasias e ilusões. Viraram costas e afastaram-se. Em casa, ambas as esposas os esperavam.

No chão: uma gota de água, levemente rosada e acobreada, com pequenas partículas de gordura, saudade, dor e paixão. Mas essas partículas, um pouco mais pequenas, eram quase imperceptíveis aos mais despercebidos.

Nunca mais se viram, nunca mais se falaram, o “Adeus” ficou sempre com eles, em forma de verso, dobrado em quatro, e trazido no bolso de trás.


Xuanita ®


Foto por Xuanita @ Milão


"Com a morte a pôr humidade nas paredes e cabelos brancos nos homens (...)"
Tabacaria, Fernando Pessoa

19 junho 2009


Há um pequeno pedaço de terra nesta bela Itália que se chama Perugia. Onde eu vivo há 5 meses. A fazer o dito Erasmus. Dentro de um mês volto a casa e há um turbilhão de sentimentos dentro de mim. Vai ser bom voltar, mas vai custar partir.

Há dias em que a saudade pesa, em que a solidão também pesa, dias menos bonitos que outros. Mas depois há dias, nos quais um sorriso, um raio de sol na minha janela, um "buongiorno signorina" vivaz e cantante das pessoas que vivem na minha rua, são o suficiente para me fazerem amar esta terra, este país e toda esta atmosfera que me deixou completamente apaixonada. As ruas que escondem segredos, os becos que respiram antiguidade e tudo o resto que não saberei nunca como explicar ou transmitir. Toda esta Itália, vou trazê-la sempre comigo, atada às minhas memórias. Esta Itália do entardecer, dos risos ao longe, desta brisa quente e dos pássaros que cantam na minha janela, que me enchem de poesia e que me fazem escrever tudo isto.



01 junho 2009

Da Saudade (2)

...

- pastéis de nata
- francesinhas
- caldo verde
- sardinha assada
- pão com chouriço
- carapau frito
- gaivotas
- Aliados / Ribeira / Foz
- frango assado da minha mãe
- conversas com o meu pai
- mimos do namorado
- sorrisos dos amigos
- séries em língua original, legendadas em PT
- cinema e pipocas
- superbock e panachés
- vinho do Porto
- gelatina
- verdinhos de rabo na boca com arroz de tomate
- avós
- tostas mistas
- doces da mãe do Rui
- torradas
- saudades do Porto, do meu Porto...

Da Saudade

A saudade bem lá no fundo até é uma coisa boa.

É boa porque nos faz lembrar constantemente de quem mesmo longe está perto. Perto na memória, perto no coração. É boa porque traz lembranças, todas elas boas. Acontecimentos, imagens, cheiros e sensações que marcaram. Pode ser a saudade do cheiro a maresia, pode ser a saudade da textura de um cobertor. Pode ser a recordação de uma lágrima vertida enquanto se vê o namorado de pé, junto à vedação do aeroporto a ver o avião partir. Saudade é a prova mais fiel que amamos. Pais, namorado, irmãos, amigos, e a nossa terra.

É tempo de regressar, de voltar a casa.

31 maio 2009

O planeta do Principezinho era tão pequenino que ele podia assistir ao pôr-do sol as vezes que quisesse. Bastava-lhe "puxar a cadeira alguns passos".
Curava assim a tristeza.
-Um dia, vi o sol pôr-se quarenta e três vezes!- confessou o Principezinho.


Eu vi o sol a pôr-se do lado oposto ao que eu estou acostumada a ver... no mar adriático, vi o sol pôr-se atrás de mim... sensação estranha esta, de não ver o pôr-do-sol no mar. Mas aquele mar é bom, sem ondas, quente e confortável. Senti-me próxima do mundo :) do outro lado do mundo, daquele que eu não conheço mas dentro em breve vou conhecer...

04 maio 2009

Viver a vicissitude das coisas, compôr a experiência com as notas que nos são dadas, afinar os acordes ao melhor tom, compôr a mais bela melodia, ou simplesmente senti-la, nem que seja só dentro de nós, naquele respiro, naquele fôlego único, naquele vislumbre rápido e feroz, em algo que só nós sentimos cá dentro e que é tão difícil explicar.

08 abril 2009

Oggi torno a casa

Sim, hoje volto.
Não durmo. Irei dormir durante a viagem toda. Assim, penso menos, racionalizo menos, reflicto menos.
Dizem que depois de partimos nunca mais voltamos a casa... e nunca se sabe se é porque a casa mudou, ou se nós mudamos.
A partir do momento em que partimos deixamos de ser os mesmos. Mudamos, nós e o mundo. O mundo muda connosco, e subitamente sentimo-nos prontos a mudar o mundo. Sensação estranha esta... sentirmo-nos capazes de tudo.

Partir simboliza um desapegar temporário, necessário à sobrevivência. Caso contrário, inviabilizamos a viagem. Regressar significa resgatar o apego silenciado e tornarmo-nos unos novamente com a terra. É por isso que partir é difícil, e regressar também. Porque ambos os paradigmas foram postos à prova e superados, e devem ser postos à prova continuamente sempre que se parte ou regressa.

Oggi torno a casa.

17 março 2009


...

"A meio do dia, o ar era uma coisa viva sobre a terra, como uma chama a arder; cintilava, ondeava e brilhava como água corrente, espelhava e duplicava todos os objectos, criando grandes miragens. Lá no alto, nos cumes, respirava-se com facilidade, inalando uma confiança vital e leveza de coração. Quando se acordava de manhã pensava-se: «Aqui estou eu, onde devia estar»"


Karen Blixen, África Minha

23 dezembro 2008


Para ele também é Natal.


Queres ajudar e não sabes como? Consulta estes sites:

Lista do Portugal Diário de Instituições mais necessitadas

Pobreza Zero

16 dezembro 2008



Porque às vezes não sou grata à vida o suficiente...

18 novembro 2008

Fiz as pazes com Eugénio de Andrade


"O teu rosto inclinado pelo vento;

a feroz brancura dos teus dentes;

as mãos, de certo modo, irresponsáveis,

e contudo sombrias, e contudo transparentes;

o triunfo cruel das tuas pernas,

colunas em repouso se anoitece;

o peito raso, claro, feito de água;

a boca sossegada onde apetece

navegar ou cantar, ou simplesmente ser

a cor de um fruto, o peso de uma flor;

as palavras mordendo a solidão,

atravessadas de alegria e de terror;

são a grande razão, a única razão."


Litania, de Eugénio de Andrade




17 novembro 2008

Um jardim para mim


Joan Miró, Garden


16 novembro 2008

A Promessa



















"- Eu que irei também morrer
saúdo-te. Eu que irei até
aos grandes campos de pedra
junto ao mar, ergo a minha chama
também por ti. Hão de evaporar
o teu espírito; mas outros virão
receber a tua parte na fraca força
messiânica, a força sem Messias.
Eu que nada posso garantir
prometo-te a promessa."


Teatros do Tempo, de Manuel Gusmão


12 novembro 2008

Porque hoje me apetece poesia

Sobre tradução de poesia (Zbiegniem Herbert)

Tradução de Herberto Helder:


"Zumbindo um besouro pousa
numa flor e encurva
o caule delgado
e anda por entre filas de pétalas folhas
de dicionários
e vai direito ao centro
do aroma e da doçura
e embora transtornado perca
o sentido do gosto
continua
até bater com a cabeça
no pistilo amarelo

e agora o difícil o mais extremo
penetrar floralmente através
dos cálices até
à raiz e depois bêbado e glorioso
zumbior forte:

penetrei dentro dentro dentro
e mostrar aos cépticos a cabeça
coberta de ouro
de pólen"


...


"É querer estar preso por vontade(...)"

Luís de Camões

09 outubro 2008

"Porque as pessoas amam a morte, a sua morte, figurativa, figurada, figurante, e amam o restabelecimento da vida. Esta é uma espécie de nomeação física que arranca à decadência em nós esparsa das imagens naturais, e transmite, em disciplina e cortejo, o prodígio e o prestígio dos objectos em torno movidos por um inebriamento cerimonial."

Herberto Helder, Cinemas

02 outubro 2008





"Eu te afago com esta mão de gato que te furta..."


Armando Freitas Filho

09 setembro 2008

21 julho 2008

Encontrei...


O meu primeiro cabelo branco.


Se o arranquei? Não. Assim de cada vez que olhar para ele sei o quanto a vida é efémera e que estou a envelhecer...

Talvez daqui a 3 dias brinde a ele.





13 julho 2008

Aviso

Avisa-se que algumas entradas no blog foram apagadas devido ao facto de terem ultrapassado o prazo de validade. De facto, e como era possível constatar a qualquer transeunte que por este site passasse, algumas já cheiravam inclusive a podre, outras roçando o pútrido, qual corpo em decomposição.


Agradeço a compreensão.

Mood for today

11 julho 2008

(Uma das) Odaliscas, de Matisse



Auto-retrato da deambulação sensível?


Desvanecer no sopro daquele que a leva. Foge para agarrar braços soltos, plásticos, moles, abstractos. Abulia. Apatia. Cansaço. É assim que possivelmente se sente a Odalisca de Matisse. Vibrante num êxtase orgiástico de cor. Será que ela esqueceu o som do silêncio?

09 julho 2008


by Kandinsky


Even if logic were confined by the senses it would still be an organic disease, by Tristan Tzara in Dada Manifesto


08 julho 2008

à descoberta...


À descoberta de Clarice Lispector.


Extracto de Uma Aprendizagem ou O Livro dos Prazeres


"[...]

Pedir? Como é que se pede? E o que se pede?
Pede-se vida?
Pede-se vida.
Mas já não se está tendo vida?
Existe uma mais real.
O que é real?
E ela não sabia como responder. Às cegas teria que pedir. Mas ela queria que, se fosse às cegas, pelo menos entendesse o que pedisse. Ela sabia que não devia pedir o impossível: a resposta não se pede. A grande resposta não nos era dada. É perigoso mexer com a grande resposta.

[...]

Ajoelhou-se trémula junto da cama pois era assim que se rezava e disse baixo, severo, triste, gaguejando sua prece com um pouco de pudor: alivia a minha alma, faze com que eu sinta que Tua mão está dada à minha, faze com que eu sinta que a morte não existe porque na verdade já estamos na eternidade, faze com que eu sinta que amar não é morrer, que a entrega de si mesmo não significa morte, faze com que eu sinta uma alegria modesta e diária, faze com que eu não Te indague de mais, porque a resposta seria tão misteriosa quanto a pergunta, faze com que me lembre de que também não há explicação porque um filho quer o beijo de sua mãe e no entanto ele quer e no entanto o beijo é perfeito, faze com que eu receba o mundo sem receio, pois para esse mundo incompreensível eu fui criada e eu mesma também incompreensível, [...] faze com que eu perca o pudor de desejar que na hora de minha morte haja uma mão humana amada para apertar a minha, amém.

Não era à toa que ela entendia os que buscavam caminho. Como buscava arduamente o seu! E como hoje buscava com sofreguidão e aspereza o seu melhor modo de ser, o seu atalho, já que não ousava mais falar em caminho. [...]

Mas também sabia de uma coisa: quando estivesse mais pronta, passaria de si para os outros, o seu caminho era os outros. Quando pudesse sentir plenamente o outro estaria a salvo e pensaria: eis o meu porto de chegada.
Mas antes precisava tocar em si própria, antes precisava tocar no mundo."

13 abril 2008

Tudo de nenhum

Gosto desta luz! É branca, transparente quase... Transmite aquilo que o outro, o coxo, procura, e aquilo que eu procuro. Respirar. Inspirar. Expirar. Com calma. Que é isto? Este sentimento que disseco? É da luz? Da respiração? Do coxo que invadiu a minha mente? Luz bonita. Luz de água, mistura de sol e água dá frescura, sabe bem. A que sabe o fresco? A água? A frio? A que sabe o sabor? A saber?
Quem será o coxo de olhos moribundos que me impressionou? Quem foi?

17 março 2008



Para ti :)
"Em mim acendes o desejo que deixei para lá do mar..."


Mais feliz que nunca! :')

13 março 2008

De praeteritus

De tudo o que aqui está escrito, falta um momento, um amor, uma pessoa que não foi devidamente celebrada.

Presa ao passado, apenas escrevi sobre faltas, quebras, tempos perdidos.

Com o meu mais sincero, feliz e verdadeiro apego à vida actual, não prestei a devida atenção a isto, à escrita, que lamento não ser indelével, mas que de tempos a tempos vai aqui cumprindo o seu papel.
Não coloco fotos. Sim, as fotos são para mim a forma mais bonita de celebrar, e recordar sentimentos, mas como são minhas, e meus, não os partilho. Não preciso. Não quero. O que é meu a mim me pertence, e dentro de mim fica.

Já pensei remodelar este blog, apagando tudo aquilo que deixou de fazer sentido, mas apesar de longe e morto, o passado faz parte de nós e, melhor ou pior, acaba construindo aquilo que somos hoje.

O que sou hoje... tu o sabes, depositaste em mim o meu melhor sorriso, aquele que só hoje faz sentido. Deste-me como prenda aquele pedaço de céu que te pedi.

E porque seremos cúmplices o resto da vida, tudo o resto, vivemos lá fora, e não aqui... que já não serve de depósito de mágoas, mas sim de ode ao meu amor, de hino à vida e à beleza.


E para terminar como iniciei:

Dum loquimur, fugerit invida
Aetas: carpe diem, quam minimum credula postero.

[Enquanto falamos, o tempo invejoso foge: aproveita o dia, muito pouco crédula no que virá.]

Horácio, séc. I a.C.

15 fevereiro 2008

Um dia...

Um dia, gastos, voltaremos
A viver livres como os animais
E mesmo tão cansados floriremos
Irmãos vivos do mar e dos pinhais.


O vento levará os mil cansaços
Dos gestos agitados irreais
E há-de voltar aos nosso membros lassos
A leve rapidez dos animais.


Só então poderemos caminhar
Através do mistério que se embala
No verde dos pinhais na voz do mar
E em nós germinará a sua fala.



Sophia de Mello Breyner Andresen

10 dezembro 2007

Ária da ópera "Dido e Eneias" - When I laid my face in earth
Lamento de Dido. Libreto de Henry Purcell.

Lindo.

"Escrever um diário é renunciar ao destino. É viver no presente, é confessar ao implacável que nada mais esperamos dele, que nos acomodamos todos os dias, e que já não há relação entre este dia e os restantes. É sorver o nosso oceano gota por gota, com receio de o atravessar a nado. É contar as folhas da árvore cujo tronco não tornará a reverdecer. Só se escreve um diário quando as paixões estão extintas, ou quando atingem o estado de petrificação que nos permite explorá-las como montanhas das quais a avalancha não se desprenderá."

"A partir do momento em que a vida se torna suportável, já não carece de análise. Arruinaremos um dia de sossego se teimarmos em dissecá-lo ao pormenor"


George Sand


A tudo isto, se deve a minha ausência de escrita.

17 outubro 2007

Tu

Gosto de ti como quem gosta do sábado,
Gosto de ti como quem abraça o fogo,
Gosto de ti como quem vence o espaço,
Como quem abre o regaço,
Como quem salta o vazio,
Um barco aporta no rio,
Um homem morre no esforço,
Sete colinas no dorso
E uma cidade p’ra mim.

Gosto de ti como quem mata o degredo,
Gosto de ti como quem finta o futuro,
Gosto de ti como quem diz não ter medo,
Como quem mente em segredo,
Como quem baila na estrada,
Vestido feito de nada,
As mãos fartas do corpo,
Um beijo louco no porto
E uma cidade p’ra ti.

Enquanto não há amanhã,
Ilumina-me, Ilumina-me.
Enquanto não há amanhã,
Ilumina-me, Ilumina-me.

Gosto de ti como uma estrela no dia,
Gosto de ti quando uma nuvem começa,
Gosto de ti quando o teu corpo pedia,
Quando nas mãos me ardia,
Como silêncio na guerra,
Beijos de luz e de terra,
E num passado imperfeito,
Um fogo farto no peito
E um mundo longe de nós.

Enquanto não há amanhã,
Ilumina-me, Ilumina-me.
Enquanto não há amanhã,
Ilumina-me, Ilumina-me.


:)

21 julho 2007



Porque eu vou conseguir agarrar este tempo...
E trazê-lo para sempre dentro de mim, colado com um sorriso e atado com abraços...

Devo a minha felicidade a todos vós, mas principalmente a mim, porque eu mudei o meu mundo, libertei-me de tudo o que me magoava, e hoje sei que tudo vale a pena :)






Àqueles que sempre estiveram comigo e nunca me abandonaram.

11 julho 2007



Vontade de abraçar o mundo... :)

05 julho 2007



"God moves in misterious ways"...
Teorias por água a baixo... sorrisos nascentes, e com o coração maior um bocadinho :)

18 junho 2007



Quero uma casa para mim assim num sitio escondido do Mundo...
Quero que alguém pegue na minha mão e dance uma valsa comigo...
Quero borboletas e violinos e flores e promessas de amor eterno...

Tenho tudo... e não tenho nada...

Apenas a minha música, a minha poesia, os vossos sorrisos, e a minha vontade de seguir em frente e lutar por tudo aquilo a que tenho direito...

Sim, sou feliz! :)

25 maio 2007

ELOGIO AO AMOR

Miguel Esteves Cardoso

"Quero fazer o elogio do amor puro. Parece-me que já ninguém se apaixona de verdade. Já ninguém quer viver um amor impossível. Já ninguém aceita amar sem uma razão. Hoje as pessoas apaixonam-se por uma questão de prática.Porque dá jeito. Porque são colegas e estão ali mesmo ao lado. Porque se dão bem e não se chateiam muito. Porque faz sentido. Porque é mais barato, por causa da casa. Por causa da cama. Por causa das cuecas e das calças e das contas da lavandaria. Hoje em dia as pessoas fazem contratos pré-nupciais, discutem tudo de antemão, fazem planos e à mínima merdinha entram logo em "diálogo".


O amor passou a ser passível de ser combinado. Os amantes tornaram-se sócios. Reúnem-se, discutem problemas, tomam decisões. O amor transformou-se numa variante psico-sócio-bio-ecológica de camaradagem. A paixão, que devia ser desmedida, é na medida do possível. O amor tornou-se uma questão prática. O resultado é que as pessoas, em vez de se apaixonarem de verdade, ficam "praticamente" apaixonadas.


Eu quero fazer o elogio do amor puro, do amor cego, do amor estúpido, do amor doente, do único amor verdadeiro que há, estou farto de conversas, farto de compreensões, farto de conveniências de serviço. Nunca vi namorados tão embrutecidos, tão cobardes e tão comodistas como os de hoje. Incapazes de um gesto largo, de correr um risco, de um rasgo de ousadia, são uma raça de telefoneiros e capangas de cantina, malta do "tá tudo bem, tudo bem", tomadores de bicas, alcançadores de compromissos, bananóides, borra-botas, matadores do romance, romanticidas.


Já ninguém se apaixona? Já ninguém aceita a paixão pura, a saudade sem fim, a tristeza, o desequilíbrio, o medo, o custo, o amor, a doença que é como um cancro a comer-nos o coração e que nos canta no peito ao mesmo tempo? O amor é uma coisa, a vida é outra.· O amor não é para ser uma ajudinha. Não é para ser o alívio, o repouso, o intervalo, a pancadinha nas costas, a pausa que refresca, o pronto-socorro da tortuosa estrada da vida, o nosso "dá lá um jeitinho sentimental".


Odeio esta mania contemporânea por sopas e descanso. Odeio os novos casalinhos. Para onde quer que se olhe, já não se vê romance, gritaria, maluquice, facada, abraços, flores. O amor fechou a loja. Foi trespassada ao pessoal da pantufa e da serenidade. Amor é amor. É essa beleza. É esse perigo. O nosso amor não é para nos compreender, não é para nos ajudar, não é para nos fazer felizes. Tanto pode como não pode. Tanto faz. É uma questão de azar.


O nosso amor não é para nos amar, para nos levar de repente ao céu, a tempo ainda de apanhar um bocadinho de inferno aberto. O amor é uma coisa, a vida é outra. A vida às vezes mata o amor. A "vidinha" é uma convivência assassina. O amor puro não é um meio, não é um fim, não é um princípio, não é um destino. O amor puro é uma condição. Tem tanto a ver com a vida de cada um como o clima.
O amor não se percebe. Não dá para perceber. O amor é um estado de quem se sente. O amor é a nossa alma. É a nossa alma a desatar. A desatar a correr atrás do que não sabe, não apanha, não larga, não compreende.

O amor é uma verdade. É por isso que a ilusão é necessária. A ilusão é bonita, não faz mal. Que se invente e minta e sonhe o que quiser. O amor é uma coisa, a vida é outra. A realidade pode matar, o amor é mais bonito que a vida. A vida que se lixe.
Num momento, num olhar, o coração apanha-se para sempre. Ama-se alguém. Por muito longe, por muito difícil, por muito desesperadamente. O coração guarda o que se nos escapa das mãos. E durante o dia e durante a vida, quando não esta lá quem se ama, não é ela que nos acompanha - é o nosso amor, o amor que se lhe tem.

Não é para perceber. É sinal de amor puro não se perceber, amar e não se ter, querer e não guardar a esperança, doer sem ficar magoado, viver sozinho, triste, mas mais acompanhado de quem vive feliz. Não se pode ceder. Não se pode resistir.
A vida é uma coisa, o amor é outra. A vida dura a vida inteira, o amor não."


Dedicado aos que amam, se entregam e vivem o amor na sua plenitude e consequências. A vós, invejo-vos.

13 maio 2007







"De todos os cantos do mundo
Amo com um amor mais forte e mais profundo
Aquela praia extasiada e nua
Onde me uni ao mar, ao vento e à lua..."


Sophia de Mello Breyner



Foto gentilmente cedida por querido amigo :)
Obrigada!

01 maio 2007


"Fecho as pálpebras roxas, quase pretas,
Que poisam sobre duas violetas,
Asas leves cansadas de voar...
E a minha boca tem uns beijos mudos...
E as minhas mãos, uns pálidos veludos,
Traçam gestos de sonho pelo ar..."

07 abril 2007

walk on...
walk on...

home, i can't say where it is, but i know i'm going home..

.....

Leave it behind, you got to leave it behind...

26 março 2007



Apesar da anacronia...
Faz sentido...

:)

22 março 2007

Agarra-me! Não me deixes ir…
Não me deixes ter vontade de ir…
Faz com que seja bonito ficar aqui…
Quero dar-me ao mar
às nuvens
às montanhas
ao sol…

Faz-me ser branca,
faz-me ser colorida,
devolve-me tudo o que perdi.

....

Joana*

11 março 2007




Miserere, miserere,
Miserere, misero me
Pero brindo alla vita!
Ma che mistero, ela mia vita
Che mistero!
Sono un peccatore dellanno ottantamila
Un menzognero!
Ma dove sono e cosa faccio
Come vivo?
Vivo nellanima del mondo
Perso nel vivere profondo!

Miserere, misero me
Pero brindo alla vita!

Io sono il santo che ti ha tradito
Quando eri solo
E vivo altrove e osservo il mondo
Dal cielo,
E vedo il mare e le foreste,
Vedo me che....
Vivo nellanima del mondo
Perso nel vivere profondo!

Miserere, misero me
Pero brindo alla vita!

Se ce una notte buia abbastanza
Da nascondermi, nascondermi,
Se ce una luce, una speranza
Sole magnifico che splendi
Dentro me
Dammi la gioia di vivere
Che ancora non cè

Miserere, miserere
Quella gioia di vivere
Che forse, ancora non cè

....

:')
Linda...
...misero me, pero brindo alla vita!...

05 março 2007

Teimosia

Teimo em viver…
Teimo em acreditar…
Teimo em sonhar…

“Maldita teimosia”-dizem-me.
“Acreditas no Nada e nele te refugias”

Fico embriagada de vida, de cor e de luz
“nada”… dizem eles, os anulados da vida…
Para mim é o Tudo e o Todo.
Absorvo todo o suspiro de vida
Abraço a fustigação dos sentidos
Fumo o branco que me preenche… que me faz una com a Terra
Sugo a vitalidade que emanas e libertas…
Espremo os macios frutos da liberdade
Limpo os poros negros, encrostados que abafam a respiração
Acaricio a delicada penugem da satisfação…

E continuo a teimar…

Cubro-me no lençol roto que me deixaste,
Aperto-o e sinto-te…
Sinto o teu bafo quente e a tua mão húmida
O teu cabelo sujo e áspero
E a tua pele doce que durante tanto tempo me alimentou

E continuo a teimar…

Desta vez teimo no pranto…
Teimo na dor, na rejeição,
No lençol que rasgaste e naquilo que levaste contigo
Levaste tudo o que de limpo eu tinha
Levaste aquele aperto
Aquele abraço
Aquele “nós”

Ainda assim… aprendi a teimar mais…
Teimar naquele sonho que sempre tive
No campo das violetas que amarelecia e vestia-se de Outono…

A minha teimosia trouxe-me aqui…

Aqui… Onde estou agora…
Como se chama? Não sei bem…

Ouvi falar em vale do desencanto…
Mas não sei bem o que significa.



...

22 fevereiro 2007

Para ti...

Sim, este post hoje é para ti!
Porque merecias, e porque este post já deveria ter sido feito à mais tempo...


Não, não estou inspirada... mas senti muito que tinha que fazer isto, hoje! agora!



Tudo fica tão longe, tão perdido, tão distante...
tudo fica tão baço, tão difuso, tão nebuloso e sombreado...
sim, eu sei que estás aí.. sempre estiveste.. sempre vais estar.. não, não vou temer, não vou chorar, não me vou lamentar, sei que vais estar sempre aqui, sempre por perto... para rir, para brincar, para fazer um mimo, para me ralhares, para me chamares à razão, para me fazeres ver o outro lado de.. tudo... Fica por aqui.. nunca fujas.. nunca vás pa longe... vamos tomar chá e vamos lembrar outros tempos, vamos lembrar o tempo em que tudo era mais fácil, vamos lembrar o tempo em que sorríamos e em que éramos felizes... sim, nós fomos felizes.. muito.. lembras-te?



Claro que sim..
Eu sei que sim...

Eu lembro-me, e muito... anseio todos os dias voltar atrás no tempo, sentir aquilo que sentíamos, viver aquilo que vivíamos... sentir que o amanhã iria sempre ser melhor...

Mas estamos aqui.. hoje.. agora.. no chamado Presente...
Presente que teima em escapar-me das mãos... Presente que não consigo agarrar, meter ao bolso e levar comigo para todo o lado... Choro por isso, choro por sentir que tudo passou e está a passar rápido de mais...
Se vivo? Sim, tento viver cada minuto, cada momento, cada instante que passa.. Vivo com urgência, pressa e rapidez... uns dias. Vivo com mansidão, brandura e quietude... outros dias!


E porque nós um dia vamos ver brilhar o sol o dia todo :) Mesmo em dias de chuva..
Sei que tendo-te ao meu lado tudo será sempre mais fácil... sei que podemos procurar em conjunto o sol teimoso e irrequieto que gosta de brincar às escondidas... sabemos onde está.. não somos ainda hábeis o suficiente para o desvendar...


Mas um dia...
sim, um dia.. :)


Tenho fé!



Dedicado a uma querida amiga :)

....

16 fevereiro 2007

Poema do silêncio

Sim, foi por mim que gritei.
Declamei,
Atirei frases em volta.
Cego de angústia e de revolta.

Foi em meu nome que fiz,
A carvão, a sangue, a giz,
Sátiras e epigramas nas paredes
Que não vi serem necessárias e vós vedes.

Foi quando compreendi
Que nada me dariam do infinito que pedi,
-Que ergui mais alto o meu grito
E pedi mais infinito!

Eu, o meu eu rico de baixas e grandezas,
Eis a razão das épi trági-cómicas empresas
Que, sem rumo,
Levantei com sarcasmo, sonho, fumo...

O que buscava
Era, como qualquer, ter o que desejava.
Febres de Mais. ânsias de Altura e Abismo,
Tinham raízes banalíssimas de egoísmo.

Que só por me ser vedado
Sair deste meu ser formal e condenado,
Erigi contra os céus o meu imenso Engano
De tentar o ultra-humano, eu que sou tão humano!

Senhor meu Deus em que não creio!
Nu a teus pés, abro o meu seio
Procurei fugir de mim,
Mas sei que sou meu exclusivo fim.

Sofro, assim, pelo que sou,
Sofro por este chão que aos pés se me pegou,
Sofro por não poder fugir.
Sofro por ter prazer em me acusar e me exibir!

Senhor meu Deus em que não creio, porque és minha criação!
(Deus, para mim, sou eu chegado à perfeição...)
Senhor dá-me o poder de estar calado,
Quieto, maniatado, iluminado.

Se os gestos e as palavras que sonhei,
Nunca os usei nem usarei,
Se nada do que levo a efeito vale,
Que eu me não mova! que eu não fale!

Ah! também sei que, trabalhando só por mim,
Era por um de nós. E assim,
Neste meu vão assalto a nem sei que felicidade,
Lutava um homem pela humanidade.

Mas o meu sonho megalómano é maior
Do que a própria imensa dor
De compreender como é egoísta
A minha máxima conquista...

Senhor! que nunca mais meus versos ávidos e impuros
Me rasguem! e meus lábios cerrarão como dois muros,
E o meu Silêncio, como incenso, atingir-te-á,
E sobre mim de novo descerá...

Sim, descerá da tua mão compadecida,
Meu Deus em que não creio! e porá fim à minha vida.
E uma terra sem flor e uma pedra sem nome
Saciarão a minha fome."

José Régio

Porque tudo isto faz sentido... hoje mais do que nunca!

26 janeiro 2007

"Para os erros há perdão; para os fracassos, chance; para os amores impossíveis, tempo. De nada adianta cercar um coração vazio ou economizar a alma. O romance cujo fim é instantâneo ou indolor não é romance. Não deixes que a saudade sufoque, que a rotina acomode, que o medo te impeça de tentar. Desconfia do destino e acredita em ti. Gasta mais horas realizando que sonhando, fazendo que planejando, vivendo que esperando, porque embora quem quase morre esteja vivo... Quem quase vive já morreu."

Luis Fernando Veríssimo

22 janeiro 2007



Andar descalça...

Sentir o frio chão, arrefecido, fresco...
Sentir a quente, macia, áspera areia...
Sentir a fresca, fofa, aprazível relva...

É bom andar descalça... sinto-me mais leve, mais solta, mais viva, mais ligada à terra e ao meu mundo... sinto-me livre... sim, penso que é a melhor palavra que poderia usar: livre.. sensação plena de liberdade, de união e comunhão com aquilo que de mais puro, genuino, natural, verdadeiro e cristalino existe... a Terra.

Sentir-me una...
livre...

....

09 janeiro 2007



Mariza - Chuva

As coisas vulgares que há na vida
Não deixam saudades
Só as lembranças que doem
Ou fazem sorrir

Há gente que fica na história
da história da gente
e outras de quem nem o nome
lembramos ouvir

São emoções que dão vida
à saudade que trago
Aquelas que tive contigo
e acabei por perder

Há dias que marcam a alma
e a vida da gente
e aquele em que tu me deixaste
não posso esquecer

A chuva molhava-me o rosto
Gelado e cansado
As ruas que a cidade tinha
Já eu percorrera

Ai... meu choro de moça perdida
gritava à cidade
que o fogo do amor sob chuva
há instantes morrera

A chuva ouviu e calou
meu segredo à cidade
E eis que ela bate no vidro
Trazendo a saudade

04 janeiro 2007


Volúpia

No divino impudor da mocidade,
Nesse êxtase pagão que vence a sorte,
Num frémito vibrante de ansiedade,
Dou-te o meu corpo prometido à morte!

A sombra entre a mentira e a verdade…
A nuvem que arrastou o vento norte…
- Meu corpo! Trago nele um vinho forte:
Meus beijos de volúpia e de maldade!

Trago dálias vermelhas no regaço…
São os dedos do sol quando te abraço,
Cravados no teu peito como lanças!

E do meu corpo os leves arabescos
Vão-te envolvendo em círculos dantescos
Felinamente, em voluptuosas danças…

Florbela Espanca, «Charneca em Flor», in «Poesia Completa»



27 dezembro 2006

Ser forte...


"Ser forte...


Ser forte é amar alguém em silêncio.


Ser forte é irradiar felicidade quando se é infeliz.


Ser forte é tentar perdoar alguém que não merece perdão.


Ser forte é esperar quando não se acredita no retorno.


Ser forte é manter-se calmo no momento de desespero.


Ser forte é demonstrar alegria quando não se sente.


Ser forte é sorrir quando se deseja chorar.


Ser forte é fazer alguém feliz quando se tem o coração em pedaços.


Ser forte é calar quando o ideal seria gritar a todos a sua angústia.


Ser forte é consolar quando se precisa de consolo.


Ser forte é ter fé naquilo que não se acredita.


Por isso, mesmo diante da dura realidade e por mais difícil que a vida possa parecer: Ame-a e seja forte!"


Autor desconhecido


16 dezembro 2006


Só porque eu hoje queria estar longe...
Longe, e de mãos dadas...
só isto, mais nada...
E tudo seria perfeito!

13 dezembro 2006



Porque todos precisamos de sonhar...

Todos precisamos de acreditar... Que talvez um dia tudo seja mais fácil, mais bonito, mais puro...

Até lá vamos sonhando... com tudo, e com nada...

10 dezembro 2006

O Principezinho



"E foi então que apareceu a raposa:
- Bom dia, disse a raposa.
- Bom dia, respondeu timidamente o principezinho, que se voltou, mas não viu nada.
- Eu estou aqui, disse a voz, debaixo da macieira...
- Quem és tu? perguntou o principezinho. Tu és bem bonita...
- Sou uma raposa, disse a raposa.
- Vem brincar comigo, propôs o principezinho. Estou tão triste...
- Eu não posso brincar contigo, disse a raposa. Não me cativaram ainda.
- Ah! desculpa, disse o principezinho.

Após uma reflexão, acrescentou:
- Que quer dizer "cativar"?
- Tu não és daqui, disse a raposa. Que procuras?
- Procuro os homens, disse o principezinho. Que quer dizer "cativar"?
- Os homens, disse a raposa, têm fuzis e caçam. É bem incómodo! Criam galinhas também. É a única coisa interessante que fazem. Tu procuras galinhas?
- Não, disse o principezinho. Eu procuro amigos. Que quer dizer "cativar"?
- É uma coisa muito esquecida, disse a raposa. Significa "criar laços..."
- Criar laços?
- Exactamente, disse a raposa. Tu não és para mim senão um menino inteiramente igual a cem mil outros meninos. E eu não tenho necessidade de ti. E tu não tens também necessidade de mim. Aos teus olhos não passo de uma raposa igual a cem mil outras raposas. Mas, se tu me cativares, nós teremos necessidade um do outro. Serás para mim único no mundo. E eu serei para ti única no mundo...
- Começo a compreender, disse o principezinho. Existe uma flor... eu creio que ela me cativou...
- É possível, disse a raposa. Vê-se tanta coisa na Terra...
- Oh! não foi na Terra, disse o principezinho.
(...)

Mas a raposa voltou à sua ideia.
- A minha vida é monótona. (...) E por isso eu aborreço-me um pouco. Mas se tu me cativares, a minha vida será como que cheia de sol. Conhecerei um barulho de passos que será diferente dos outros. (...) O teu me chamará para fora da toca, como se fosse música. E depois, olha! Vês, lá longe, os campos de trigo? Eu não como pão. O trigo para mim é inútil. Os campos de trigo não me lembram coisa alguma. E isso é triste! Mas tu tens cabelos cor de ouro. Então será maravilhoso quando me tiveres cativado. O trigo, que é dourado, fará lembrar-me de ti. E eu amarei o barulho do vento no trigo...

A raposa calou-se e considerou por muito tempo o príncipe:
- Por favor... cativa-me! disse ela.
- Bem quisera, disse o principezinho, mas eu não tenho muito tempo. Tenho amigos a descobrir e muitas coisas a conhecer.
- A gente só conhece bem as coisas que cativou, disse a raposa. Os homens já não têm tempo de conhecer alguma coisa. Compram tudo prontinho nas lojas. Mas como não existem lojas de amigos, os homens não têm mais amigos. Se tu queres um amigo, cativa-me!
- Que é preciso fazer? perguntou o principezinho.
- É preciso ser paciente, respondeu a raposa. Tu te sentarás primeiro um pouco longe de mim, assim, na relva. Eu te olharei com o canto do olho e tu não dirás nada. A linguagem é uma fonte de mal-entendidos. Mas, cada dia, te sentarás mais perto...

No dia seguinte o principezinho voltou.
- Teria sido melhor voltares à mesma hora, disse a raposa. Se tu vens, por exemplo, às quatro da tarde, desde as três eu começarei a ser feliz. Quanto mais a hora for chegando, mais eu me sentirei feliz. Às quatro horas, então, estarei inquieta e agitada: descobrirei o preço da felicidade! Mas se tu vens a qualquer momento, nunca saberei a hora de preparar o coração... É preciso ritos. (...)

Assim o principezinho cativou a raposa. Mas, quando chegou a hora da partida, a raposa disse:
- Ah! Eu vou chorar.
- A culpa é tua, disse o principezinho, eu não queria te fazer mal; mas tu quiseste que eu te cativasse...
- Quis, disse a raposa.
- Mas tu vais chorar! disse o principezinho.
- Vou, disse a raposa.
- Então, não sais lucrando nada!
- Eu lucro, disse a raposa, por causa da cor do trigo.

Depois ela acrescentou:
- Vai rever as rosas. Tu compreenderás que a tua é a única no mundo. Tu voltarás para me dizer adeus, e eu te farei presente de um segredo.
Foi o principezinho rever as rosas:
- Vós não sois absolutamente iguais à minha rosa, vós não sois nada ainda. Ninguém ainda vos cativou, nem cativastes a ninguém. Sois como era a minha raposa. Era uma raposa igual a cem mil outras. Mas eu fiz dela um amigo. Ela á agora única no mundo.
E as rosas estavam desapontadas.
- Sois belas, mas vazias, disse ele ainda. Não se pode morrer por vós. Minha rosa, sem dúvida um transeunte qualquer pensaria que se parece convosco. Ela sozinha é, porém, mais importante que vós todas, pois foi a ela que eu reguei. Foi a ela que pus sob a redoma. Foi a ela que abriguei com o pára-vento. Foi dela que eu matei as larvas (exceto duas ou três por causa das borboletas). Foi a ela que eu escutei queixar-se ou gabar-se, ou mesmo calar-se algumas vezes. É a minha rosa.

E voltou, então, à raposa:
- Adeus, disse ele...
- Adeus, disse a raposa. Eis o meu segredo. É muito simples: só se vê bem com o coração. O essencial é invisível para os olhos.
- O essencial é invisível para os olhos, repetiu o principezinho, a fim de se lembrar.
- Foi o tempo que perdeste com tua rosa que fez tua rosa tão importante.
- Foi o tempo que eu perdi com a minha rosa... repetiu o principezinho, a fim de se lembrar.
- Os homens esqueceram essa verdade, disse a raposa. Mas tu não a deves esquecer. Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas. Tu és responsável pela rosa...
- Eu sou responsável pela minha rosa... repetiu o principezinho, a fim de se lembrar. "
O Principezinho é um dos livros mais bonitos que li até hoje. É uma história contada por um adulto a várias crianças, ou por uma criança a vários adultos. A visão simples de uma criança a retratar o complicado mundo dos adultos, numa forma enternecedora e sincera como só uma criança pode ser.
Este capítulo toca-me particularmente... é certo que a frase "Tu tornas-te eternamente responsável por tudo aquilo que cativas" é das mais conhecidas deste livro, e também das mais citadas, mas eu acho que bem lá no fundo ninguém sente, vive ou põe em prática o sentido que está explicito na frase. Para mim resume toda uma atitude que precisamos adoptar perante a vida e perante os que nos rodeiam, cuidar, cativar e cultivar o nosso carinho pelos outros, pelos que nos são próximos, pelos que de alguma forma nos tocam ao coração.
À cerca do livro só posso dizer que me tocou como muito poucos.
Dedicado a todos aqueles que até hoje me cativaram e me fizeram cativa.